Dirigido por Aly Muritiba
Quando pensamos em suspense, automaticamente lembramos de Alfred Hitchcock. Ele não criou o gênero (Pode-se dizer que os “pais” são os diretores do Expressionismo Alemão, e a mãe Lois Weber), mas com certeza, o diretor britânico foi o que melhor o desenvolveu. E, obviamente, nasceram pupilos à medida que os anos se passaram, que ajudaram o Suspense a se desenvolver ainda mais. Assisti muitos deles. Mas poucos me tocaram tanto no que diz respeito a esse gênero, quanto o filme do diretor baiano.
Algo supra essencial nos filmes de suspense, para o diretor, é o controle das informações. O quanto devemos saber, a que momento devemos saber e como devemos lidar com isso. O melhor exemplo disso na filmografia de Hitchcock, é em Um Corpo Que Cai (1958), considerado o melhor filme do diretor. Nele, o controle das informações e as ações dos personagens são uma aula de Suspense. Aly Muritiba conseguiu não só repetir isso, mas aumentar a carga de suspense ao máximo com este filme.
Somos apresentados a Fernando (Fernando Alves Pinto) e seu filho. A criança, o encontra dormindo sobre roupas de mulher. A partir desse ponto, a rotina de Fernando é exposta. Ele é viúvo. E em seu dia-a-dia, tudo é feito em prol de sua ex-esposa. As noites organizando suas roupas, o seu emprego fotografando mortos (foi assim que ele encontrou sua ex-mulher falecida), ele buscando objetos no antigo escritório de advocacia dela. O viúvo cultua a memória dela. Mesmo morta, ela é o centro da vida de Fernando. Mas ele encontra fitas VHS as quais Fernando ainda não tinha visto.
Ao assistir, boom! Primeira informação! Um detalhe da vida dela é descoberto. A ex-esposa de Fernando, mantinha uma relação extraconjugal. Claramente transtornado, o viúvo decide ir atrás do amante dela. E a partir desse momento, eu me impressionei com a atuação do Fernando (Ator). Ele começa a agir com frieza, calma e tranquilidade. Contrastando com a raiva que ele estava sentindo por dentro. Fernando descobre o local onde o amante mora e que ele é casado e tem dois filhos. O viúvo os conhece na igreja da cidade. Logo depois, se apresenta para ele. E esse primeiro contato já conta com o primeiro momento de alta carga de suspense. Porém, Fernando não faz nada das coisas que borbulham em nossa mente. Pelo contrário. Ele aluga uma das casas do amante.
Ok! Amigos próximos, inimigos mais próximos ainda (O Poderoso Chefão). Aly mexe com nossa mente a partir desse momento de maneira genial. “O que Fernando vai fazer?”. Primeiro, a aproximação com a filha do amante. Fernando meio que a seduz, lhe oferece cigarros. “Então é isso! Ele vai atrair a menina!” Eis o momento: Ela entra na casa de Fernando, levando comida. Ele vai até a cozinha, enquanto a menina senta na cama. Zero diálogos! Para mexer ainda mais com a gente. Com seu jeito frio e lento, Fernando desliga a tv, senta ao lado dela… e… a manda sair. Essa é só uma das cenas de suspense incríveis desse filme. Mas não é a melhor.
O amante está fazendo um serviço no quintal. Fernando vai até ele, no meio da noite. Eles conversam sobre relações conjugais, enquanto o viúvo trabalhava com uma pá. Uma… pá. As insinuações de Fernando no diálogo, juntas as informações que nós temos, transformou a cena num primor técnico! Note: A câmera não está parada. Há movimento, justamente para indicar a tensão da conversa. E a câmera segue os movimentos de Fernando que cavava, cavava. No ápice do diálogo, quando falavam de relações EXTRACONJUGAIS, Fernando pára de cavar, levanta a pá… e a põe atrás da cabeça. E o diálogo continua… e a tensão aumenta. “É agora! Ele vai matá-lo! Agora!”. O amante começa a descrever a esposa morta de Fernando… e aí… ele volta a cavar. Agora só com Fernando sendo filmado. Nos dias seguintes, as tensões continuam, quando ele insinua mexer com a esposa do amante. Mais suspense!
Aly Muritiba merece todas as felicitações por essa bela obra. Não fica em nada atrás dos clássicos hitchcockianos. Muritiba fez nossos corações baterem, pupilas dilatarem, ouvidos aguçarem, como todo filme de suspense deve fazer.
Fernando Alves Pinto é conhecido por fazer ótimos filmes nacionais. Ele já havia atuado muito bem em 2 Coelhos, um ótimo filme de ação. Mas essa atuação neste filme foi sublime. Perceberam? Quando ele não tinha a informação de que sua falecida esposa mantinha relações fora do casamento, ele vivia para ela. Se apegava às suas roupas, suas fitas, seu cheiro… E, de certa forma, isso continuou após ele assistir aquela fita. Fernando se apegou a única coisa viva que havia sobrado de sua ex-mulher. Seu ex-amante e família. Ele continuava vivendo para sua amada morta.
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